Budismo

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Rogério
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Budismo

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Bem pessoal, segue a abaixo a apresentação do budismo para que quem quiser possa debater ou tirar suas dúvidas.

Embora já tenha deixado algum material de consulta, o texto abaixo é uma referência neutra: uma matéria da revista Superinteressante contando a resumidamente a história do budha e do budismo a partir da era axial até sua difusão no ocidente.

Boa Leitura!:4

O iluminado

Caco de Paula

Meio milênio antes de Cristo, o príncipe hindu Sidarta Gautama deixou seu luxuoso palácio e sua família para seguir os passos da mendicância, do jejum, da meditação. E acabou criando uma religião que crê no homem e que, hoje, influencia cada vez mais pessoas no Ocidente. Com você, a fascinante história de Buda e de sua doutrina

Há 3 000 anos começaram a se formar as principais filosofias e religiões que organizaram as visões de mundo do homem contemporâneo. Alguns filósofos, como o alemão Karl Jaspers, dão a essa época o nome de Era Axial. Axial diz respeito a eixo. Foi, portanto, quando o homem começou a buscar o seu eixo. Ou, segundo Jaspers, quando passamos a prestar atenção em nós mesmos. A Era Axial estende-se entre os séculos VIII e II a.C. "Nessa época, as pessoas discutiam sobre espiritualidade com o mesmo entusiasmo com que hoje se discute futebol", diz a escritora inglesa Karen Armstrong, uma das mais respeitadas estudiosas de religião, autora de best-sellers como Maomé e Buda. Os historiadores ainda não sabem o que causou esse despertar para a religião e para a filosofia, nem por que ele se concentrou na China, no Mediterrâneo Oriental, na Índia e no Irã. Acredita-se que com as sociedades agrícolas, mais estáveis, o homem ganhou tempo extra para dedicar-se à contemplação.
O certo é que todos os sábios desse período parecem seguir um caminho comum quando conclamam seus contemporâneos a radicais mudanças em suas vidas. Do século VIII ao VI a.C. os profetas de Israel reformaram o antigo paganismo hebreu. Na China dos séculos VI e V a.C., Confúcio e Lao-Tsé chacoalhavam as velhas tradições religiosas. Na Pérsia, o monoteísmo desenvolvido por Zoroastro expandiu-se e influenciou outras religiões. No século V a.C., Sócrates e Platão encorajavam os gregos a questionar até mesmo as verdades que pareciam mais evidentes. Tudo acontecendo mais ou menos junto. E é bem no meio dessa era, no século VI a.C., que surge o criador do Budismo, uma das mais influentes religiões do mundo, hoje com quase 400 milhões de adeptos.

No caldo da primeva Era Axial, a Índia também passou por grandes transformações. Sua cultura foi dominada pelos arianos, antigos povos nômades que teriam migrado da Ásia Central 4 000 anos antes. A sociedade ariana dividia-se em castas: brahmins, os sacerdotes; ksatriyas, os guerreiros e governantes; vaisyas, os camponeses e criadores de gado; e sudras, os escravos ou marginais. O que determina a inclusão em uma dessas classes é a hereditariedade – ou seja, somente aquele que nasceu de mãe da casta bramânica podia realizar rituais e curas. Para os brâmanes, a essência do universo está em Brahman, deus primordial que se expressa em uma infinidade de outras deidades. Sua rígida espiritualidade é expressa nas escrituras sagradas conhecidas como Vedas. Na Índia dessa época, os sacerdotes tinham uma espécie de reserva de mercado. E, assim como acontecia em outras regiões, surgiu uma revolta contra esses sacerdotes e seus rituais – que incluíam sangrentos sacrifícios de animais.

Mas novos movimentos reinterpretavam as antigas tradições, procurando afastar-se desses rituais e buscar outro tipo de sacrifício, mais interno, de renúncia às coisas do mundo – aquela atenção a si mesmo descrita por Jaspers.

É nessa Índia em ebulição espiritual que surge Sidarta Gautama, o Buda. Ele nasceu em 563 a.C. em Lumbini, aos pés do Himalaia, em uma região que hoje pertence ao Nepal. Era um aristocrata, da casta ksatrya, a dos guerreiros e governantes. Seu pai, Shudodhana, era o rei do clã dos sakyas. Vem daí o outro nome pelo qual Sidarta se tornaria conhecido: Sakyamuni, ou "o sábio silencioso dos sakyas". O pai de Sidarta, temendo que se cumprisse uma profecia segundo a qual ele se tornaria um homem santo, cercou-o de luxos e prazeres, acreditando que se o mantivesse ignorante sobre o sofrimento do mundo, iria afastá-lo do caminho espiritual. Sidarta tinha um palácio para o inverno, outro para o verão e um terceiro para a época das chuvas. Na adolescência, vivia cercado por belas moças, ocupadas em diverti-lo em seus aposentos decorados com sugestiva arte erótica. Aos 16 anos, escolheu-se uma noiva para ele, a bela Yashodhara, com quem teria um filho, Rahula.
Pouca coisa mudaria na sua vida até os 29 anos. Apesar de todo o luxo, Sidarta sentia-se infeliz. Certo dia, contra a vontade do pai, saiu para passear fora do palácio e se surpreendeu com quatro cenas que o tirariam para sempre daquela vida de prazeres. Primeiro, viu um velho arqueado, de pele enrugada, movendo-se com dificuldade. Depois, avistou um doente que sofria dores terríveis. Mais tarde, cruzou seu caminho um cortejo fúnebre. Um morto era carregado por amigos e parentes que choravam sua perda. Foi um choque e tanto para alguém que sempre vivera protegido, sem se dar conta de que tudo que nasce também se degenera, envelhece e morre. "A imagem que temos de Sidarta Gautama pelas antigas escrituras é a de um jovem às voltas com problemas existenciais, angustiado por questões ligadas ao mistério da vida", diz o monge brasileiro Nissin Cohen, que traduziu para o português o Dhammapada, uma das mais importantes escrituras budistas.
A quarta visão do passeio de Sidarta foi um mendigo errante, esmolando por comida. Apesar da sua pobreza, tinha porte ereto, feições radiantes e expressão de profunda serenidade. Sidarta determinou-se a também abraçar uma vida santa e a buscar uma resposta para o sofrimento que viu no mundo. Uma decisão como essa não era tão incomum na Índia daquela época. Acreditava-se que somente quando se abandona a vida doméstica e os laços afetivos para tornar-se um eremita ou andarilho é que se conseguem as respostas para a busca espiritual. Essa busca tinha um objetivo específico. A maioria da população indiana acreditava em alguma forma de renascimento ou transmigração, em um ciclo interminável que começa no nascimento, passa para a velhice, a morte e recomeça em novo nascimento. O ideal que todos desejavam era algo capaz de pôr fim a esse ciclo, que pudesse libertar o espírito desse movimento circular.

Sidarta abandonou o palácio enquanto todos dormiam. Saiu de fininho, sem ao menos se despedir da mulher e do seu pequeno filho. O príncipe logo aprendeu a dormir no chão e a esmolar por comida. Além da mendicância, a vida de filósofo-andarilho (ou sramana) incluía práticas de meditação. Na sua busca, ele se aproximou de dois famosos mestres e rapidamente chegou aos últimos estágios de absorção contemplativa propostos por eles. Mas ainda não atingira a suprema realização que buscava. Dedicou-se então à automortificação. As práticas ascéticas são comuns às formas primitivas da maior parte das religiões, inclusive no Judaísmo, Cristianismo e Islamismo. O que está por trás da autoflagelação é a idéia de que um rígido controle dos sentidos desenvolve a autodisciplina e transfere o máximo de energia corporal para a atividade mental.

Durante seis anos, Sidarta experimentou privações e dores. Mudou radicalmente a alimentação, ampliando o período entre as refeições. De uma por dia, passou a uma a cada dois dias, três, quatro, até alimentar-se somente a cada 15 dias. Depois, diminuiu a quantidade até chegar à ração diária de um único grão de arroz. Simultaneamente, fazia experiências psicológicas, analisando em si mesmo certas emoções que, acreditava, só poderia eliminar completamente se as observasse em profundidade. Para analisar o medo e meditar sobre a impermanência, passava noites deitado entre cadáveres e esqueletos num cemitério. Ainda assim, não alcançara sua realização final. O próprio Sidarta descreve os efeitos dos jejuns: "Quando eu pensava estar tocando a pele do meu abdomem, era a minha coluna que eu segurava". Abandonou essas práticas quando já era quase só pele e ossos. Sua experiência provou que a autoflagelação embota a mente em vez de favorecê-la.
Ele intuiu, então, que o caminho para a libertação não estava nos excessos de ascetismo, nem nos da sensualidade, mas em um ponto de equilíbrio entre eles. Vem daí a expressão "caminho do meio", um dos pilares do Budismo.

Sidarta voltou a comer. Segundo conta-se, uma porção de arroz e leite oferecida por uma jovem que o encontrou quase morto à beira de um rio. Dias depois, recuperado, preparou um assento de capim sob uma figueira – que ficaria conhecida como a árvore bodhi, ou árvore da iluminação – na região de Bodhgaya, no norte da Índia. Decidiu então que ou atingiria a iluminação ali ou morreria. Mesmo para um alto praticante como ele, surgiram obstáculos. Alguns relatos os descrevem na forma de tentações e demônios, como Mara, deus indiano da morte. São imagens que simbolizam os obscuros medos reprimidos, fragmentos de memória, dúvidas, fantasias e outros conteúdos mentais tão persistentes e familiares a quem já tenha tentado alguma prática meditativa. Sidarta transpôs esses obstáculos e, serenamente, dominou todos os estágios de meditação. Como fez isso? As escrituras dizem apenas que ele permaneceu imóvel diante das investidas de Mara. Mas há uma pista nas técnicas para lidar com esses conteúdos mentais.

Uma delas é a meditação de ponto único. Nela, a observação concentra-se em um objeto específico (a respiração, por exemplo), controlando ou suspendendo temporariamente o fluxo dispersivo de pensamentos.

Assim, Sidarta tornou-se um Buda numa noite de lua cheia no mês de maio, quando tinha 35 anos. Buda não é um nome próprio, mas uma palavra em sânscrito que significa "o Desperto" ou "o Iluminado". Esse título passou a definir a condição de Sidarta Gautama e ficou ligado ao seu nome, da mesma maneira como o título de Cristo ("Salvador") associou-se ao nome de Jesus.

O detalhamento dessa experiência sob a figueira tornou-se o corpo dos seus ensinamentos, cuja essência é não fazer o mal, praticar o bem e purificar a mente. Buda ampliou o conhecimento sobre a mente humana e acreditava ter descoberto uma verdade profunda que lhe permitiu viver grande transformação interior e conquistar a imunidade ao sofrimento. Depois da sua iluminação, passou 45 anos ensinando outras pessoas a fazer o mesmo e organizou comunidades de monges só homens. No início, o próprio Buda não era favorável à admissão de mulheres em sua ordem. Parece que sua preocupação era com a dispersão que a presença delas pudesse representar em uma comunidade que tinha como um de seus pilares o total controle dos desejos. Mas acabou mudando de idéia.

A grande novidade trazida por Buda em sua época foi a idéia de que a vida espiritual, como capacidade de conhecer a si mesmo, não tem nada a ver com as restrições de casta impostas pelos brâmanes. Foi um salto e tanto para a estrutura social da Índia, que aceitou prontamente essa religião tolerante. Buda diz que todos os seres humanos têm vislumbres de iluminação. Isso acontece nos momentos em que aquele insistente e auto-referente "eu" não interfere, quando a mente não se prende ao passado, não sonha com o futuro e se envolve apenas com o momento presente. Esses vívidos momentos de ligação com o aqui-e-agora contrastam com a mente habitual. Eles surgem como relances fugidios, mas podem também ser voluntariamente induzidos pelo processo meditativo. Aí está o fim do sofrimento, a iluminação, o nirvana.

A essência dos ensinamentos budistas está nas práticas meditativas, que se fundam em tradições anteriores ao próprio Buda. Na meditação busca-se cessar a atividade mental ininterrupta, na qual pensamentos e fantasias bloqueiam a experiência direta e intuitiva. Na maior parte do tempo alimentamos pensamentos que podem nos deixar ansiosos, frustrados, com mágoa, raiva, ressentimento ou medo. Tragada por esse vórtice de sensações, nossa atenção perde o foco. É por isso que, muitas vezes, comemos sem sentir o sabor do alimento, olhamos uma pessoa sem vê-la de fato. Por quase meio século, Buda viveu cercado de multidões às quais receitava antídotos para essa dispersão, como a chamada "atenção plena", prática que consiste em dispensar o máximo de atenção a tudo o que se faz – e que está na base de várias técnicas meditativas.

Buda morreu por volta de 483 a.C., depois de um acesso de disenteria que teria sido causado pela ingestão de carne de porco. Há algo menos divino – ou tão demasiadamente humano – do que morrer de dor de barriga? Sua doutrina foi transmitida através de numerosas linhagens de mestres que se espalharam por vários países. Quando morreu, seus ensinamentos estavam bem estabelecidos na região central da Índia. Havia muitos seguidores leigos, mas o coração da comunidade eram os monges mendicantes, os bhiksus. Sua doutrina se espalhou por uma poderosa rede de mosteiros e tomou diversas formas, adaptando-se a diferentes situações históricas e culturais. Essa característica flexível do Budismo seria determinante para sua difusão. Por ser ele mesmo mutável e impermanente, o Budismo tem um mecanismo interno que barra o fundamentalismo – risco presente em outras religiões, cuja história está manchada de sangue.

"Não deveis aceitar nada por ouvir falar, tampouco porque está nas escrituras", disse Buda em um discurso. Como sua ênfase é a compaixão, o Budismo não define a si mesmo como solução melhor que qualquer outra. O Budismo primitivo, a rigor, nem era uma religião, mas um conjunto de práticas morais e mentais. No que diz respeito à meditação, essas práticas podem ser vistas como simples técnicas, que não implicam em compromisso com nenhum tipo de religiosidade.

Como resultado da sua expansão, cerca de 300 anos depois da morte de Buda, o Budismo já se dividia em 18 escolas. Seus ensinamentos, mantidos por transmissão oral, agora estavam escritos. Vários concílios foram organizados para dar homogeneidade às escrituras das diversas escolas. Um deles, realizado no século III a.C., resultou no chamado Cânone Páli, o registro mais antigo dos ensinamentos budistas. Pouco depois, o Budismo dividiu-se em duas tradições, cada uma delas afirmando-se como possuidora do verdadeiro sentido da palavra de Buda. A tradição Theravada, ou "à maneira dos antigos", que se baseava exclusivamente nos textos escritos na língua páli, espalhou-se pelo sudeste da Ásia. Para o praticante Theravada, Buda não era um deus, mas sim um grande sábio. O objetivo do caminho Theravada é iluminação individual.
A outra tradição é a Mahayana (literalmente "Grande Veículo"), que se instalou sobretudo na China, Coréia e Japão. A base de seus ensinamentos também está na prática da meditação. No Budismo Mahayana, porém, Buda já não é apenas um sábio, mas uma divindade reverenciada. Assim como os chamados bodhisatvas, seres considerados iluminados, que adiam sua entrada no nirvana para poder ajudar na iluminação de outros. Foi no âmbito das escolas Mahayana que mais se desenvolveram os aspectos sobrenaturais e imaginários do Budismo. Sidarta, ou Buda Sakiyamuni, jamais se apresentou como um enviado, salvador ou reencarnação de quem quer que fosse. Nos seus discursos não há referência sequer ao fato de que existe reencarnação. Ele não disse palavra a favor ou contra a idéia de Deus.

O conceito de buda já não se restringia a Sidarta, o Buda Sakyamuni. Passou a definir um princípio fundamental de iluminação espiritual. Sakyamuni já não era mais "o" buda, mas sim "um" buda. As tradições orientais sustentam que houve muitos budas no passado e que ainda haverá muitos outros no futuro. Ampliando o conceito de que há tantos budas quanto grãos de areia, esse Budismo pop expandiu-se amigavelmente pelo Oriente, incorporando uma infinidade de arquétipos ou divindades locais. (Ao contrário das religiões abraâmicas, que demonizaram os deuses das culturas dominadas. Leia mais sobre isso na pág. 55.) Isso explica por que existem tantas imagens diferentes do Iluminado. Quando ele é representado como um asceta esquelético, refere-se ao Sidarta da fase pré-Buda. Quando mostrado como um meditador sereno, é o Buda Sakyamuni.

Se a figura for a de um sujeito gorducho e sorridente, quase sempre trata-se de uma divindade local, geralmente símbolo de prosperidade, na China e no Japão. O mesmo ocorre com os dhianybudas, ou budas da meditação, aos quais se atribuem significados ocultos. Ou com as 21 belas figuras da jovem Tara – representação do aspecto feminino e compassivo de Buda, cultuada na tradição tibetana. Também vêm do Tibete as famosas imagens de budas em abraços sexuais com suas consortes, um símbolo da unidade entre iluminação e sabedoria.
Apesar do grande florescimento que teve em sua terra natal, o Budismo foi varrido da Índia em decorrência das invasões dos hunos no século V d.C. e dos islâmicos nos séculos XII e XIII. A corrente que mais se expandiu foi a Mahayana, por ser menos ortodoxa que a Theravada. O maior desenvolvimento do Budismo aconteceu na China, onde chegou no século I d.C., e, depois, na Coréia e no Japão. Seu encontro com as tradições chinesas deu origem à escola de meditação Ch’an e, mais tarde, no Japão, ao Zen Budismo. "Zen" é uma palavra japonesa derivada do chinês ch’an, que vem do sânscrito dhyana – técnica que, segundo a psicologia do yoga, conduz a um elevado estado de consciência em que o homem une-se com o universo. Os chineses preferiram encontrar essa união no trabalho cotidiano, em vez de na meditação solitária numa floresta, como o próprio Sidarta.

O Zen é um dos mais importantes herdeiros da vertente Mahayana -– só equiparado pela corrente Vajrayana, que se desenvolveu no Tibete. Chamado de "Caminho do Diamante", o Vajrayana tem suas origens encravadas em textos budistas do século II, registrados nos chamados tantras, escrituras esotéricas sobre a transformação da mente através de meditações, visualizações e ritos. Essa linha surgiu no norte da Índia há cerca de 2 000 anos e hoje é seguida pela tradição tibetana.
O Budismo só penetraria no Ocidente a partir do século XIX, com o estudo das culturas da Índia e a publicação de O Mundo como Vontade e Idéia. Nesse livro, o alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860), que influenciaria muitos outros filósofos, como Friedrich Nietzsche, mergulha nos ensinamentos budistas. O Budismo também chegou à Europa e à América junto com os imigrantes chineses e, depois, japoneses. Mas foi somente com a chegada de mestres Zen, nos anos 30 do século XX, que algumas das principais idéias budistas começariam a ter maior difusão ocidental. Para a mentalidade judaico-cristã, que tem sua solução religiosa na pessoa externa de um pai divino, um grande motivo de estranhamento – e de fascínio – causado pelo Budismo talvez seja a idéia de um caminho espiritual que depende, em última instância, apenas do esforço de cada pessoa. O Budismo sustenta que o mundo é uma projeção da mente e que, portanto, o homem não poderá encontrar no exterior aquilo que não possua dentro de si mesmo.

Nos anos 40 e 50, os livros sobre Zen escritos pelo inglês Alan W. Watts (1915-1973) influenciaram os escritores da geração beat, como Jack Kerouac e Allen Ginsberg, gurus dos movimentos que iriam chacoalhar os anos 60, como a contracultura e os hippies. Com a invasão do Tibete pela China, em 1959, e a Guerra do Vietnã, nos anos 60, mestres budistas desses países migraram para o Ocidente, onde abriram vários centros de meditação. Estava traçado o caminho que levaria o Budismo para a Califórnia e os estúdios de Hollywood, atraindo adeptos de classe média alta, além de muitos artistas e terapeutas. Diferentemente do que aconteceu na primeira metade do século XX, quando Zen era sinônimo de Budismo no Ocidente, nas últimas décadas o ramo que mais se difundiu foi o Budismo tântrico do Tibete. Algo que ajudou muito nessa divulgação foi a figura sorridente do Dalai Lama, líder do Tibete no exílio, que já era famoso bem antes de ganhar o Prêmio Nobel da Paz em 1989, de dançar no palco com a banda de punk-rap Beastie Boys em shows pela libertação do Tibete, ou de percorrer o mundo falando de espiritualidade. Inclusive no Brasil, onde um dos organizadores de suas visitas é o gaúcho Alfredo Aveline, ou lama Padma Santem (lama é a palavra em tibetano para "mestre espiritual"). Aveline dá uma pista de como essa linha espiritual pode ajudar o homem do século XXI, ao falar da importância do desapego como uma forma de evitar o sofrimento: "A impermanência paira sobre sua cabeça nas relações, no emprego, na sua saúde, no seu endereço, no seu celular, na sua aparência, nas suas aptidões, no afeto. Essa é a vida a que todos estão submetidos. No Budismo, o objetivo é ultrapassar essas limitações. Não estamos dizendo que buscamos distância dessa experiência limitada, mas nosso objetivo é libertarmo-nos dos processos sutis que a criam para ajudar os outros seres a fazer o mesmo e superar as frustrações inevitáveis do processo".

Dizem que Buda previu que sua ordem duraria muito menos se tivesse a participação de mulheres. Se realmente fez isso, talvez esteja aí um raro equívoco cometido pelo Iluminado. Hoje o que se vê é uma presença cada vez maior de mulheres na pregação da sua doutrina. Às vezes, numa mesma semana na capital paulista, quatro mulheres budistas de diferentes escolas e linhagens costumam atrair grande público para suas palestras: a inglesa Lama Caroline, da escola tibetana Gelupa; a americana Lama Tsering, da escola tibetana Ningma; a monja chinesa Chueh Chen, da escola Ch’an; e a brasileira monja Coen, formada nas tradições japonesas do Soto Zen. Quem quiser entender por que o Budismo exerce tanta atração no Ocidente precisa ver como elas consquistam sua audiência, geralmente de jovens, em torno da idéia da compaixão.

"Houve uma geração que quebrou todos os seus valores e hoje mergulha na busca espiritual", diz a monja Cláudia Coen, que todos os dias orienta grupos de meditação em São Paulo. "Como as técnicas funcionam independentemente da religião de quem as pratica, tem despertado o interesse também de judeus, cristãos e muçulmanos."

Mas, afinal, o que fez o Budismo ser tão bem-aceito no Ocidente? Numa palavra, poder-se-ia dizer que é seu caráter de auto-ajuda, conceito que, nesse caso, nada tem a ver com manuais de comportamento, mas sim com a certeza de que todas as respostas para os problemas do homem estão dentro dele mesmo.

Gasshô :7

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Rogério
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Resumo da Doutrina Budista


As Quatro Nobres Verdades

Existe o Sofrimento. Sofrimento é: nascimento, velhice, doença, morte, estar na presença do que se detesta, estar longe do que se gosta, não obter o que se deseja, perder o que se deseja. “Sofrimento” significa a natureza insatisfatória de todas as experiências que vivemos.

Causas do Sofrimento. Os três venenos da mente são a causa de todo sofrimento: ignorância, desejo e aversão.

A Cessação do Sofrimento. Cessando os três venenos.

O Caminho para Cessação do Sofrimento. É o Nobre Caminho Óctuplo.

O Nobre Caminho Óctuplo

Compreensão Correta. Saber distinguir os nutrientes saudáveis dos não saudáveis, o pensamento errôneo do correto, a fala errônea da correta, etc. Compreender as Quatro Nobres verdades, o karma, a impermanência e o não-eu. É também uma profunda confiança no Caminho, e uma visão adequada da realidade.

Pensamento Correto. É o pensamento que está de acordo com a compreensão correta. Reflete a realidade das coisas, sem distorções subjetivas. É o pensamento que não provém e nem alimenta os três venenos da mente: ignorância, desejo, aversão. É cultivar uma mente de altruísmo, uma mente que busca o Caminho iluminado.

Fala Correta. Falar de forma calma e amorosa e ouvir com atenção e compaixão. Não mentir, caluniar, distorcer os fatos ou exagerar. Não ferir nenhum ser através de nossas palavras. Não falar inutilmente. Não semear a discórdia. Não falar mal dos outros. Nossas palavras devem sempre estar de acordo com o Caminho,devem sempre serem benéficas.

Ação Correta. Não-violentar; não roubar; não ter má conduta sexual; comer, beber e consumir apropriadamente.

Meio de Vida Correto. Encontrar uma forma de viver que não o obrigue a matar, fraudar, mentir, vender armas, drogas, bebidas ou escravos; não tirar a sorte.

Esforço Correto. É diligência, a perseverança no Caminho. Há quatro práticas ligadas ao esforço correto: não alimentar sementes não-sadias em nossa consciência; abandonar as sementes não-sadias já manifestas; alimentar as sementes sadias; manter as sementes sadias já manifestas. Esforço correto é abandonar a visão errônea e adotar a visão correta; abandonar o pensamento, a fala e a ação errônea e adotar o pensamento, a fala e a ação correta. Esforço correto, acima de tudo, é domar a sua mente.

Atenção Plena Correta. Atenção plena significa estar em pleno contato com o nosso corpo, sensações, emoções, pensamentos, formações mentais, e estados de consciência. É a prática de observar e cuidar de tudo o que aparece em nós, seja positivo ou negativo.

Concentração Correta. É a prática da meditação, zazen. É permanecer profundamente absorto aqui-e-agora, onde toda dualidade desaparece. A concentração correta é o resultado natural da prática dos outros itens do Caminho.Cada um dos aspectos do Caminho contém os outros sete.

Os itens 1 e 2 correspondem à Sabedoria; os itens 3, 4, 5 à Ética; e os itens 6, 7, 8 à Meditação.

Elementos Básicos do Buddhhismo

Impermanência. Todas as coisas são impermanentes. Tudo muda o tempo todo sem parar. Nada é igual nem por um instante. Nada é estável. Um minuto atrás, nós éramos diferentes tanto física quanto mentalmente. O que nos faz sofrer não é a impermanência em si, mas o nosso desejo de que as coisas sejam permanentes enquanto elas não o são. Impermanência é movimento, é vida. As coisas só existem na sua forma e cor presentes.

Não-eu. Nada que existe tem existência em si mesmo, separada e independente. Cada coisa precisa estar ligada com todo o universo para poder existir. Cada coisa é uma junção de elementos que não são ela mesma. Não existe nada que é separado do resto, que possa existir de forma independente e definitiva.

Interdependência. Vazio. Nada pode existir por si só. Tudo é criado por várias condições, e todos os fenômenos estão inter-relacionados. É a Unicidade. Quem compreende profundamente esta verdade pratica a compaixão, pois vê que é um com tudo o que existe. Tal pessoa compreende um segredo da vida: que a felicidade só pode ser encontrada na compaixão e no altruísmo, e que seguir os nossos desejos egoístas só nos traz sofrimento e perturbação. A interdependência pode ser resumida no seguinte ensinamento do Buddha: “Vos ensinarei o Dharma: se isso existe, aquilo vem à existência; do surgir disso, surge aquilo; se isso não existe, aquilo não vem à existência; da cessação disto, aquilo cessa”. Todas as ondas (fenômenos) pertencem ao mesmo oceano (unidade, totalidade, verdade) da Vida.

Karma. É a lei de causa e efeito. Construímos karma através das nossas ações de corpo, da fala e da mente. As ações virtuosas geram bons resultados e felicidade; as ações não-virtuosas geram más condições e sofrimento. A retribuição kármica se dá em três etapas do tempo: nessa mesma vida, na próxima vida, em vidas posteriores. Momento após momento nós geramos karma e criamos a nossa realidade.

Samsara. Todos os seres estão sujeitos à roda do nascimento e da morte sucessivos. O Buddhismo acredita que as energias kármicas emanadas das nossas ações boas e más geram um novo corpo e uma nova mente de acordo com a natureza dos impulsos kármicos. Samsara em sânscrito significa “perambulação”.

Nirvana. Nirvana é a Liberdade Incondicionada. É a liberação total do sofrimento, um estado de paz inabalável e de indescritível felicidade. É um estado além de todos os conceitos.

As Três Práticas: Ética; Meditação; Sabedoria.

Os Cinco Desejos Básicos: comida/bebida; sono; sexo; riquezas; fama.
Os Três Tesouros: Buddha: O ser iluminado, ou o Absoluto; Dharma: os ensinamentos, o Caminho; Sangha: a comunidade de praticantes.

Os Cinco Preceitos: 1. Não matar; 2. Não roubar; 3. Não mentir; 4. Não ter conduta sexual imprópria; 5. Não lidar com intoxicantes. Não seguir os preceitos não é "pecado"; é, simplesmente, ignorância. "Enquanto a má ação está verde, o perverso nela se satisfaz; mas, uma vez amadurecida, ela lhe traz frutos amargos." – Dhammapada, 119.

As Duas Verdades: É a verdade absoluta e a relativa. Em termos relativos, é preciso praticar para extinguir o sofrimento; em termos absolutos, não há sofrimento, nem caminho, nem realização — a onda já é a água. Absoluto e relativo se encaixam perfeitamente, e as duas verdades se complementam. Devemos viver em contato tanto com o absoluto quanto com o relativo.

As Três Qualidades do Dharma

Impermanência: Todas as coisas são impermanentes. Tudo muda o tempo todo sem parar. Nada é igual nem por um instante. Nada existe que possa ser considerado um eu permanente. Um minuto atrás, você era diferente do que é agora, tanto física quanto mentalmente. O que nos faz sofrer não é a impermanência em si, mas o nosso desejo de que as coisas sejam permanentes enquanto elas não o são. Impermanência é movimento, é vida.

Não-eu, ou Vazio: Nada que existe tem existência em si mesmo, separada e independente. Cada coisa precisa estar ligada com todo o resto para poder existir. Cada coisa é uma junção de elementos que não são ela mesma. Nada possui uma essência estável e permanente, por isso as coisas só existem assim como elas são agora. As ondas (todas as existências particulares) são manifestações passageiras do mar (o Todo, o conjunto e a fonte de todas as condições).

Nirvana: Nirvana é o estado de absoluta liberdade e de completo silêncio do coração, além de todos os conceitos. Literalmente nirvana significa “extinção”: extinção das nossas ilusões, desejos, e outros estados mentais negativos. O nirvana já é a base da nossa existência, a natureza búdica sempre foi o nosso verdadeiro ser. O que precisamos é nos esforçar para compreender e manifestar a nossa natureza mais profunda.

As Três Portas da Liberação
Vazio (Sunyata): O vazio é o Caminho do Meio entre a existência e a não-existência. Vazio significa que nada possui um eu. Quando as nossas ações emanam da consciência da natureza vazia da realidade, são ações iluminadas.

Ausência de Imagens (Animitta): Imagem é qualquer sinal que está na nossa consciência (sinal provindo de um dos seis sentidos). A realidade encontra-se além dos sinais. Tudo se manifesta através de imagens, mas as imagens nos enganam.

Ausência de Objetivo (Apranihita): Nada existe a ser feito ou realizado. A verdade mais profunda da existência é que nós já somos o todo, já somos a natureza de Buddha. Nesse sentido absoluto, nada nos falta. A ausência de objetivos é o que permite viver o momento, e ser felizes aqui e agora.

Os Quatro Pensamentos Incomensuráveis
Amor: é o desejo de que os outros seres sejam felizes, e a ação nesse sentido. É um sentimento incondicional, que nasce da compreensão da unidade fundamental de todas as coisas.

Compaixão: é o desejo de que os outros não sofram e a ação para aliviar a dor alheia. Quando entramos em contato com o sofrimento do outro, a compaixão brota em nosso coração. Para isso precisamos de atenção plena.

Alegria: a alegria provém naturalmente de um coração que reconhece a preciosidade que é ter nascido como um ser humano e poder praticar o Dharma.

Equanimidade: é o desapego aos opostos, olhá-los de forma igual. Equanimidade significa imparcialidade, não discriminação, equilíbrio mental. É não discriminar “eu” e “outros”. É permanecer imóvel ao sofrer palavras e ações injustas, e ao ouvir elogios. É não permitir que surja a irritação, a amargura, o desânimo. É experimentar todas as sensações sem deixar surgir desejo ou aversão.

Os Cinco Agregados
Forma (rupa): é o nosso corpo físico.

Sensação (vedana): elas podem ser agradáveis, desagradáveis ou neutras. Toda/s as sensações são impermanentes e sem substância (como todos os outros quatro Agregados)

Percepções (samja): nossas percepções são sempre distorcidas por nossas aflições mentais já presentes: o medo, o desejo, a raiva.

Formações Mentais (samskara): existem 51 tipos de formações mentais, e duas delas são as sensações e as percepções. Esse Quarto Agregado é composto por todas as outras 49 formações mentais. Tudo que é feito de um outro elemento é uma “formação”.

Consciência (vijnana): é o alicerce sobre o qual erigimos nossas formações mentais.

Os Cinco Agregados não são sofrimento em si, mas produzem sofrimento ao nos apegarmos a eles.

As Seis Perfeições
Dana (Generosidade): é o doar, a caridade, a abertura do coração. É dar sem apego. Podemos dar coisas materiais, ensinamentos, ou a nossa presença, estabilidade e paz. Fazer algo com a consciência de seu valor absoluto também é dar.

Sila (Ética): é viver de acordo com os preceitos buddhistas.

Kshanti (Paciência): é a capacidade de tudo aceitar e de perdoar, sem rancor, as injustiças que nos foram cometidas. É alargar o nosso coração para que um punhado de sal não deixe nossa água salgada. É ser como a terra, que tudo acolhe sem reclamar ou discriminar. É absorver tudo o que nos acontece na vida. É semelhante à equanimidade.

Virya (Esforço): determinação, energia, perseverança. É não desanimar ou desistir. Não vacilar. Avançar sem recuar, decididamente. Nosso esforço deve ser correto, e não devemos nos apegar aos resultados.

Dhyana (Meditação): é a prática do zazen, a prática da atenção plena. É clarear e libertar a mente. É consumir-se por completo naquilo que se está fazendo, estando totalmente presente e consciente.

Prajna (Sabedoria): é a sabedoria da não-discriminação. É a capacidade de ver as coisas como elas são. Prajna Paramita é a mãe de todas as paramitas e a base de seu desenvolvimento. Prajna é a compreensão do vazio.
As seis perfeições, ou paramitas são, em última análise, uma só.

Os Sete Fatores do Despertar Atenção Plena

A investigação dos fenômenos

Esforço

Serenidade

Alegria

Concentração

Equanimidade

Buddha disse que, praticando a Atenção Plena, os Sete Fatores do Despertar se fazem presentes.

As Cinco Lembranças

Eu tenho a natureza daquilo que envelhece. Não há como escapar da velhice.

Eu tenho a natureza daquilo que adoece. Não há como escapar da doença.

Eu tenho a natureza daquilo que morre. Não há como escapar da morte.

Tudo que me é caro e todas as pessoas que amo tem a natureza daquilo que muda. Não há como não me separar deles.

Minhas ações de corpo, fala e mente são meus únicos pertences verdadeiros. Não há como escapar da conseqüência de minhas ações. Elas são o chão no qual eu piso.

Outros

Os Três Mundos: passado, presente, futuro.

Os Três Reinos: o reino dos desejos, o reino da forma, o reino da não-forma.

Os Três Tipos de Orgulho: achar-se superior aos outros; achar-se inferior aos outros; achar-se tão bom quanto qualquer um.

Os Quatro Tipos de Apego: apego aos prazeres dos sentidos, apego às opiniões, apego às regras e ritos, apego à noção de um "eu".

Os Cinco Poderes: fé, esforço, atenção, concentração, sabedoria.

Os Seis Sentidos: visão, audição, olfato, paladar, tato e mente.

Os Seis Grandes Elementos: terra, água, ar, fogo, espaço (akasha) e consciência.

As Oito Consciências: As cinco primeiras consciências (os cinco sentidos); manovijnana (consciência mental); manas (intelecto, consciência discriminativa); alayavijnana (consciência armazenadora, mente inconsciente).

Os Oito Aspectos da Iluminação: livre da ganância, capacidade de satisfazer-se; quietude; esforço diligente; memória correta; concentração; sabedoria; evitar discussões à toa.

Os Doze Elos da Originação Interdependente: ignorância (avidya); ação intencional (samskara); consciência (vijnana); nome e forma (nama rupa); os seis sentidos; contato; sensação; desejo; apego, vir-a-ser; nascimento; velhice e morte.

Gasshô :7
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Rogério
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Re: Budismo

Mensagem não lida por Rogério »

Mas como estas verdades simples são entendidas pelas diferentes escolas, tendecias e filosofias tornando-o multifacetado ?

As 4 nobres verdades são entendidas exatamente da mesma maneira em cada uma das escolas. O centro dos ensinamentos são os mesmos.

Onde entra o guru na filosofia original de Sidarta ?

Ele próprio é o primeiro Guru, na verdade ele foi discípulo de 2 mestres antes de seguir a via do pratiekabudha (ou realizador solitário). Posteriormente a isso os ensinamentos tiveram de ser transmitidos de maneira oral (como sempre foi feito na antiga índia) até assentar por escrito.

O aspecto comercial que existe em torno da meditação não seria um desvio da filosofia de Sidarta ?

Se você diz do Budismo em si, não é cobrado em nenhum centro pelas práticas meditativas. Pelo menos nos centros que frequentei. Quando eu visitar os países asiáticos, irei ter uma noção melor da questão.

Quando foi escrito o código de disciplina monástica ?

O Vinaya sempre foi transferido oralmente até o assentamento por escrito nos Sutras. Foi estipulado pelo próprio Sidharta, assim como por um grupo seleto de praticantes.

Como as punições aos desvios a este código se relacionam com a filosofia original ?

Não existe Punição do Vinaya a não ser a expulsão do praticante em caso de: Matar Pai, Matar mãe, Matar Mestre e extuprar.

As diversas formas de budismo ou escolas não são frutos de interpretações ?

Não. Apenas há adaptações culturais e de método. Mas verifiquei de maneira empírica que os métodos são iguais na essência.

Paz
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Re: Budismo

Mensagem não lida por Rogério »

Caro JBrother, vc Citou:

Você é budista ? Se assim for acho que pode explicar com muito mais propriedade o fator humano a que me refiro, e sua influencia sobre uma instituição, talvez falando sobre o Zen na Europa por Taisen Deshimaru em relação ao Soto Shu no Japão ou outras divergências.

A questão é que o próprio Budha estabeleceu a adaptação de seus ensinamentos conforme o contexto social.

No Japão, após a sua quase extinção nas mãos de Oda Nobunaga, o budismo japonês tomou rumos completamente fora do dharma. Lá o budismo tornou-se "religião-para-defunto" sob ordem e exigência do próprio governo Japonês que nunca foi tolerante com religiões estrangeiras. Os budistas tiveram que se adaptar para a sobrevivência do dharma nas "terras de lá".
Várias foram as tentativas de estirpar o budismo do japão, mesmo no século 20, o que o fez tornar-se uma mera religião cerimonial. Mas o dharma corretamente ensinado, mantêve-se intacto nos mosteiros. E é esse que chega ao ocidente nas mãos de mestres como Moryama Roshi e Daissen.

Paz
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Re: Budismo

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Rogério,

Já ouvi dizer que o Budismo é uma filosofia que aceita divergência de opinião. Eu particularmente acredito que uma crença para aobreviver ao longo do tempo deva de alguma forma ter certo grau de subjetividade ou generalização, para que se acomode para culturas e épocas diferentes. Entretanto isto de certa forma dá margens para que pessoas distorçam certos conceitos por uma opnião pessoal. Vejo isto claramente no Cristianismo, pois percebo que as religiões cristãs querem criar normas ou princípios onde a Bíblia ão se manifesta, entretanto onde a Bíblia não se manifesta, poderia ser justamente um campo onde Deus estaria deixando para cada pessoa com base em sua conciência descidir, princípio do livre arbítrio. Infelizmente o problema existe quando instituições religiosas não aceitam este certo grau de liberdade pois acreditam que isto é uma ameaça a unidade, que na verdade acaba sendo não unidade mas padronização. Você acredita que hoje no que se tornou a religião Budista, digo religião pois originalmente o Busdismo era uma filosofia ou modo de vida e não religião, mas com o passar do tempo e a interferencia do pensamento humano ouve uma transformação ao ponto de se tornar assim, e ao ponto de haverem instituições voltadas para isto. Você vê de alguma forma uma interferencia negativa ou desvio da filosofia original ? Não digo no Budismo enquanto filosofia ou modo de vida, mas enquanto seguimentos específicos no meio ou instituições ? Ou você acredita que diferente de outras filosofias ou crenças com o advento do fenômeno religião ele se preservou incólume a esta questão ?
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Rogério
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Re: Budismo

Mensagem não lida por Rogério »

Caro JBrother, vc postou:

Entretanto isto de certa forma dá margens para que pessoas distorçam certos conceitos por uma opnião pessoal. Vejo isto claramente no Cristianismo, pois percebo que as religiões cristãs querem criar normas ou princípios onde a Bíblia ão se manifesta, entretanto onde a Bíblia não se manifesta, poderia ser justamente um campo onde Deus estaria deixando para cada pessoa com base em sua conciência descidir, princípio do livre arbítrio. Infelizmente o problema existe quando instituições religiosas não aceitam este certo grau de liberdade pois acreditam que isto é uma ameaça a unidade, que na verdade acaba sendo não unidade mas padronização.

Bem.

Primeiramente temos de ser francos em alguns pontos: as institucionalizações são males necessários. Não há como uma doutrina/filosofia/ideologia sobreviver como tal sem haver uma instituição que a preserve. Provavelmente você não teria seu exemplar da bíblia em mãos se as igrejas não tivessem existido, nem tão pouco eu seria budista, pois os escritos jamais chegariam as minhas mãos (os textos budistas originais foram destruídos pelas invasões dos árabes muçulmanos, dos unos brancos e massacre por parte dos hinduístas).

Não estou levando em consideração questões metafísicas na ordem: Deus preservaria sua palavra ou os Buddhas reencarnariam para a preservação do dharma puro. Não estou lidando com metafísica aqui.

Se a instituição por um lado inibe a liberdade de interpretações pessoais, há de se verificar que certo legalismo se faz útil para evitar algumas “merdas” que os praticantes de determinadas visões fazem. Pegamos a bíblia, por exemplo: numa interpretação pessoal alguém pode começar a achar que realmente é melhor cortar as mãos ou arrancar os olhos seja a maneira mais acertada de não perder o reino de Deus. Se formos considerar esta liberdade total de interpretação, não deveríamos sequer impedir o indivíduo com base na nossa própria visão, pois estaríamos intervindo no livre arbítreo de outro.

O problema maior da instituição é possibilidade de corrupção, aí entra todas as instituições humanas, não apenas religiosas. Nada impede que um irmão teu lhe “mate” ou que sua esposa lhe traia mesmo que a instituição “família” siga um determinado contrato social.
Um amigo pode lhe “sacanear” assim como você mesmo, em dado momento, pode trair alguém. Possibilidade de “corrupção de ideais” há em todo o lugar. Você pode fugir de todas as instituições que quiser, mas vai encontrar “a possibilidade de corruptibilidade” em qualquer canto.
É por causa deste tipo de coisa que existem ermitões.

Eu mesmo era reticente a entrar numa Sangha Budista: para mim, que tenho o hábito de ser “lobo solitário” era o legítimo budista de livro: lia e praticava dentro do que eu sabia. Isso me fez deparar com obstáculos bem ruins que felizmente minha Sensei conseguiu desobstruir. Tive que dar um “puta passo adiante” para descobrir meus bloqueios: largar a paranóia de achar que em tudo que é grupo alguém vai me apunhalar pelas costas. Em outras palavras, deixar de ser um covarde... Tem horas que é bom ser como a Dory do Procurando Nemo: É só continuar a nadar: criar confiança e ir em frente.

Ter uma base institucional, mesmo que não pretenda seguir exatamente aquele caminho é bom para ter um alicerce e depois se quiser pode seguir a própria vereda se assim desejar. Pegar o que achar “ok” e aparar as pontas que não lhe são adequadas.

Você acredita que hoje no que se tornou a religião Budista, digo religião pois originalmente o Busdismo era uma filosofia ou modo de vida e não religião, mas com o passar do tempo e a interferencia do pensamento humano ouve uma transformação ao ponto de se tornar assim, e ao ponto de haverem instituições voltadas para isto.

Bem. Eu via o budismo como religião, mas religião é uma visão ocidental, mesmo “budismo” é uma invensão ocidental. No Oriente, o budismo é chamado Buddha Dharma ou Caminho de Buddha”. Jainimismo, Taoísmo e Confucionismo estão também longe de serem religiões.

Você vê de alguma forma uma interferência negativa ou desvio da filosofia original ? Não digo no Budismo enquanto filosofia ou modo de vida, mas enquanto seguimentos específicos no meio ou instituições ?

Sim. Grupos neo-budistas onde os ensinamentos de buddha são substituídos por ensinamentos de “novos buddhas” e o pessoal insiste em chamar de budismo.
O outro ponto ruim é a infelizmente necessária mescla com a política, a principal corruptora dos caminhos espirituais. Eu até entendo em alguns casos, como na Coréia do Sul onde cristãos fundamentalistas tentam restringir as ações dos budistas ou derrubar templos em “nome do senhor”. Mas prevejo que, infelizmente, se começarem a migrar para a política, vai gerar muito nicho corrupto, nos templos coreanos.

Ou você acredita que diferente de outras filosofias ou crenças com o advento do fenômeno religião ele se preservou incólume a esta questão ?

Pelo menos, no que noto com relação ao tipo de budismo que esta migrando para o ocidente, creio que o sistema de treinamento (veja que o budismo não pode se enquadrar como filosofia) tenha mantido a mesma finalidade (busca do despertar) e tenha sido preservado, ao menos no que tenho comparado aos sutras, tantras e tradições antigas. Vejo sim muitos elementos filosóficos acrescentados, mas que não fez desaparecer o sentido original, pois ainda é “livrar-se de Dukha”. O próprio buddha havia dito que o que ele havia ensinado, eram como uma punhado de folhas na mão e o que havia para ser compreendido como folhas numa floresta.

Por fim. Uma tradição para sobreviver tem que tomar rumos diferentes e precisa ser renovada. Santos católicos, estátuas de buddha e outras coisas precisam existir para que as pessoas “visuais” possam ter uma compreensão melhor do que ensinamento “ouvido”. Desde que a essência não se perca e o contexto respeitado, tudo bem.
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Re: Budismo

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Qual sua opinião sobre Ram Bahadur Bomjan ?
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Rogério
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Re: Budismo

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Caro JBrother

A capacidade meditativa dele é realmente impressionante.

O Budismo tibetano é conhecido por ter práticas que despertam sidhis como estes apresentados por Banjam. Sempre fui cético com relação ao que ele fazia, até que filmaram-no dia e noite afim de verificar a veracidade da questão. Ficar 6 meses sem se alimentar ou beber, sendo que ele nem excreta (embora sue mesmo em temperaturas perto de zero) posso levantar a 3 possibilidades:

1 - Estamos lidando com um mutante, com capacidade de reaproveitar “muito bem” aquilo que consome.

2 –Estamos lidando com alguém com uma facilidade incrível para o desenvolvimento espiritual que vem de alguma circunstância kármica. Neste caso será um grande líder espiritual quando “crescer”.

3 – Há muitas meias verdades nesta história.

Os cientistas querem fazer um estudo sobre ele. O Lama local aceitou que se fizesse, mas é um pouco complicado fazer isso sem movê-lo. Além disso, Banjam já saiu deste estado meditativo (desapareceu e depois voltou tempos depois).

Ele esta ganhando popularidade em sua terra natal. Se ele tem algo a ensinar o tempo irá dizer e eu vou analisar com base no Kalama Sutra:

Tenhais confiança não no mestre, mas no ensinamento.
Tenhais confiança não no ensinamento, mas no espírito das palavras.
Tenhais confiança não na teoria, mas na experiência.
Não creiais em algo simplesmente porque vós ouvistes.
Não creiais nas tradições simplesmente porque elas têm sido mantidas de geração para geração.
Não creiais em algo simplesmente porque foi falado e comentado por muitos.
Não creiais em algo simplesmente porque está escrito em livros sagrados; não creiais no
que imaginais, pensando que um Deus vos inspirou.
Não creiais em algo meramente baseado na autoridade de seus mestres e anciãos.
Mas após contemplação e reflexão, quando vós percebeis que algo é conforme ao que é
razoável e leva ao que é bom e benéfico tanto para vós quanto para os outros, então o
aceiteis e façais disto a base de sua vida."

Sidharta Gautama – o Buddha
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Re: Budismo

Mensagem não lida por shurelambers »

Amigo Rogério

Tenho nos últimos meses perguntando o mesmo pra pessoas das mais variadas religiões. Estou fazendo uma compilação e gostaria também da sua opinião.

O Budismo trabalha com o conceito de "salvação"? Existe algum tipo de ensinamento na doutrina budista que diga que se eu não seguí-la, não alcançarei tal salvação e que apenas o Budismo é um caminho verdadeiro?

Abs.
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Rogério
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Re: Budismo

Mensagem não lida por Rogério »

Caro amigo Shure:

Para explicar isso, temos de verificar um pouco da metafísica budista.

O karma, ou lei de causa e efeito, é aquilo que permeia toda a ação no universo. Tudo o que acontece gera um resultado na mesma proporção.

Na visão budista, todos nós geramos karma, e este retorna para nós na forma de resultados.
Bem, ao gerar karma que ainda não foi pago, este karma se acumula numa parte da nossa consciência chamada “Alaya” que é o nível mais sutil de nossa mente.
Quando morremos, os aspectos fundamentais da nossa mente, empregnado por este karma, dissolvem-se na Alaya, esta deixa o corpo e passa a vagar pelos 6 reinos da existência (Humano, Animal, Inferno, Fantasmas Famintos, Ashuras e Deuses). Ao encontrar um corpo no qual seja atraída e que esteja em formação (na concepção) a Alaya penetra neste ser e uma nova vida se desenvolve.

Neste processo cíclico de vir-a-ser, a alaya vai viajando por estes reinos até que todo o débito kármico seja “queimado” e então aquela alaya se funde ao absoluto e daí para onisciência e onipresença.

Se uma alaya habita um corpo que quitou todo o “débito kármico” este indivíduo torna-se um buddha independente a nacionalidade, sexo ou religião em que ele se manifesta (no caso de Sidarta Índia/ Masculino/Hinduismo). Um budha que faz votos de voltar para ajudar outros a alcançarem a liberdade desta perambulação (Samsara) entre os reinos de existência é chamado de bodhisatva. Um exemplo ocidental de bodhisatva seria Jesus.

Bem. O detalhe é que o karma pode conduzir a alaya para qualquer outra forma de existência e, se a pessoa atingir a iluminação (a expiração de todo o karma) no exato momento da sua morte, ela toca o absoluto.

O débito que falta pode ser justamente seguir por uma trilha que o budismo não ensina. Pode ser que um ferrenho materialista tenha de passar pela existência humana desta maneira para quitar este débito kármico e para daí ele se fundir no absoluto (um cristão chamaria Deus ou reino de Deus) e eu, como budista, não consiga este ato.

Enfim a visão budista é: se eu sou budista é meu karma sê-lo se você é católico é seu karma sê-lo. O budismo é uma etapa do meu processo assim como ser católico é parte do seu.

Se expirar o karma que me mantêm budista, deixarei de sê-lo assim como se expirar o karma que o torna católico.

É muito engraçado alguns mestres budistas responderem “não” para aquelas pessoas que perguntam: você é budista? Elas ficam sem entender, mas é melhor para evitar gerar karma da discriminação. Um mestre budista já não é mais "budista".

O ensinamentos budistas e jainimistas pregam que o budismo e o jainimismo são uma etapa no processo de todo o ser sensciente rumo ao absoluto: todo mundo é, foi, ou será budista ou janimista em algum renascimento e esta etapa será necessária em algum momento do processo. Por isso que não se prega o budismo ou o jainimismo: você se torna budista ou jainimista por inclinação kármica. Se não for budista/jainimista nesta vida, não tem problema, um dia você foi ou será.

Curiosidades:

Sobre o que acontece entre uma “vida e outra” recomendo o Livro Tibetano dos Mortos. É o primeiro manual da humanidade.
Explica detalhadamente como proceder enquanto você estiver morrendo e durante a sua viagem até a próxima vida.

Quando alguém esta morrendo e não for da sua mesma religião que o budista, os monges e lamas tibetanos são orientados a falar sobre a fé e de aspectos positivos da vida do “morimbundo” seja recitando os textos sagrados ou falando sobre as crenças dela. Jamais deve-se falar sobre as crenças pessoais do budista, pois isso implicará em perturbação para a mente no momento que esta a alaya esta sendo transferida.

Lama Michel, que é reconhecido como um renascimento de um mestre tibetano, e sua mãe, Lama Everest, auxilia nos hospitais e instituições pacientes terminais a morrerem em paz.

O Dalai Lama diz que mestres que estão para morrer entram em estado meditativo. Seu mestre morreu, mas levou 13 dias “indo e voltando” antes de morrer em definitivo.
Aceitou ser estudado por cientistas neste estágio, e autorizou estudarem outros mestres que passem pelo mesmo processo.

Paz Mano!
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