Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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APOCALIPSE ADIADO
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Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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A vida do ser humano é curta e passageira, cheia de imprevistos e mudanças que podem levá-lo do êxtase ao desespero, uma caminhada cheia de obstáculos rumo a morte. Sem a menor chance de fugir dessa verdade cruel, o ser humano tenta de todas as formas encontrar uma explicação que possa amenizar esta triste sina. Do intelecto humano já surgiu de tudo, desde imortalidade da alma a reencarnação, de vida eterna no céu ao tormento eterno no inferno de fogo ou talvez uma chance de purificação num purgatório ou limbo, sem falar num paraíso junto a Alá ou um estado de elevação espiritual chamado nirvana, tudo isto baseado numa sensação chamada por muitos de fé, palavra essa que denota firme convicção em algo a despeito de qualquer tipo de prova ou critério objetivo de verificação, portanto algo sem evidencia ou comprovação clara.
Desde os tempos remotos o ser humano tenta desvendar este mistério. Os antigos povos sumérios e acadianos já tinham suas crenças sobre vida após a morte e algum tipo de adoração a antepassados falecidos. Os mortos eram enviados para um mundo subterrâneo do qual não havia retorno. Os vivos reverenciavam os mortos, pois acreditavam que assim garantiriam o bom andamento das coisas no mundo dos vivos. Não existia concepção de julgamento pós-morte entre os mesopotâmicos. Acreditava-se que o “espírito” dos mortos atravessava um rio até o “sombrio” mundo dos mortos, onde permaneceria pela eternidade (Jeremy Black and Anthony Green. Gods, Demons, and Symbols of Ancient Mesopotamia, Fifth University of Texas Press Printing, 2003).
Os maias, astecas e incas chegavam a fazer sacrifícios humanos, arrancando o coração da vítima ainda por pulsar e bebendo seu sangue diante do Deus Sol, numa tentativa de prolongar sua vida e acalmar sua divindade. Nas festividades da colheita os astecas davam as vítimas de sacrifícios taças de chocolate para que as almas chegassem mais rápido ao céu de uma forma que agradasse as divindades, pois o chocolate era considerado o alimento dos Deuses. As vítimas sacrificiais deveriam ser perfeitas e havia grande honra em conhecerem e serem escolhidas pelo imperador, tornando-se, depois da morte, espíritos com caráter divino que passariam a oficiar junto aos sacerdotes (Guy Annequim, Religião e Ciência entre os Maias, A Civilização dos Maias. Rio de Janeiro, Otto Pierre Editores, 1977).
No antigo Egito o processo de mumificação era uma tentativa de vencer a morte. Quando o corpo morria sua alma ia para o Reino dos Mortos. Enquanto a alma residia nos Campos de Aaru, o Deus Osíris exigia pagamento pela proteção que ele propiciava. Acreditava-se que colocando bastante riqueza junto ao morto, ele teria mais facilidade em sua outra vida. Obter a recompensa no outro mundo era uma verdadeira provação, exigindo um coração livre de pecados e a capacidade de recitar encantamentos, senhas e fórmulas do Livro dos Mortos. No Salão das Duas Verdades, o coração do falecido era pesado contra uma pena da verdade e justiça, retirada de um ornamento na cabeça da deusa Maet. Se o coração fosse mais leve que a pena, a alma poderia continuar, mas, se fosse mais pesada, era devorada pelo demônio Ammit (Rosalie David, Religião e Magia no Antigo Egito. Difel, 2011. ISBN 9788574321165).
No poema épico Odisseia, Homero refere-se aos mortos como “espectros consumidos”. Uma ultravida de eterna bem-aventurança existiria nos Campos Elísios, mas estaria reservada para os descendentes mortais de Zeus. Em seu Mito de Er, Platão descreve almas sendo julgadas imediatamente após a morte e sendo enviadas ou para o céu como recompensa ou para o submundo como punição. Depois que seus respectivos julgamentos tivessem sido devidamente gozados ou sofridos, as almas reencarnariam. O Deus grego Hades é conhecido na mitologia grega como rei do submundo, um lugar gélido entre o local de tormento e o local de descanso, onde a maior parte das almas residiam após a morte. Os romanos tinham um sistema de crenças similares quanto à vida após a morte, com Hades sendo denominado Plutão. O príncipe troiano Enéas, que fundou a nação que se tornaria Roma, visitou o submundo de acordo com o poema épico Eneida (Junito de Souza Brandão, A vida após a morte na Grécia Antiga. “Mitologia Grega", Vol. II. Petrópolis, Vozes, 2004).
Povos tribais na Melanésia, na Polinésia, na Nova Guiné, na Índia, na Ásia, na África e nas Américas do Sul e do Norte, acreditam que os espíritos dos mortos são capazes de infligir todo tipo de danos aos vivos, sendo os parentes próximos considerados como os mais letais (James George Frazer. The Belief in Immortality and the Worship of the Dead. Londres, Macmillan, 1913).
Todas estas crenças refletem a inconformidade do ser humano diante da morte. Muitas pessoas não satisfeitas com a esperança do além túmulo desenvolveram crenças relacionadas com poções mágicas, águas milagrosas ou árvores da vida que supostamente poderiam prolongar a vida eternamente.
Os alquimistas chineses criaram vários elixires contendo cinábrio, enxofre, arsênico e mercúrio. Joseph Needham fez uma lista de imperadores que morreram provavelmente por ingerirem esses elixires. Na mitologia grega a Ambrosia, o manjar dos deuses do Olimpo era tão poderoso que se um mortal o comesse, ganharia a imortalidade. Segundo os alquimistas europeus, um elixir poderia ser sintetizado por meio da Pedra Filosofal prolongando a vida somente até que um acidente os matasse. Johann Conrad Dippel teria elaborado um óleo animal, chamado de Óleo de Dippel, que alguns acreditavam que seria o Elixir da Longa Vida. Uma destacada lenda urbana diz que o cientista Isaac Newton criou e bebeu essa poção, mas em vez de proporcionar-lhe a vida eterna, proporcionou-lhe a morte.
O clássico mito sumério “A Epopéia de Gilgamés”, uma das mais antigas obras literárias conhecidas narra a incessante busca do herói por uma fonte milagrosa que curava e tornava a pessoa imortal. Pausànias, geógrafo e historiador grego do 2º século d.C., misturando lenda e realidade, falava de uma fonte que chamava de Calatos, situando-a próximo a Náuplia, no Peloponeso, na qual Hera se banhava para parecer sempre jovem e bela a Zeus, seu marido. Alexandre, o Grande, teria procurado pela fonte da juventude (ou pelo rio da imortalidade) durante sua campanha na Índia. Uma das razões pelas quais Fernando e Isabel, os Reis Católicos da Espanha, patrocinaram as viagens de Cristóvão Colombo era encontrar a fonte da juventude. O explorador espanhol Juan Ponce de León (1460-1521) tinha mais de 50 anos quando empreendeu a procura da fonte da juventude e do rio da imortalidade (Gonzalo Fernández de Oviedo. Historia General y Natural de las Indias, Livro 16, Capítulo XI). Obviamente, todos estes esforços se mostraram inúteis e acabaram em desilusão.
Alguns escritos religiosos da antiga Caldeia afirmam que próximo de Eridu havia um jardim com uma misteriosa árvore sagrada plantada por divindades, cujas raízes eram profundas e os ramos atingiam o céu. Era protegido por espíritos guardiões onde nenhum homem poderia entrar. Na antiga literatura babilônica há freqüentes referências à árvore da vida. Representações da árvore são freqüentes em baixos-relevos e selos de alabastro. Seus frutos supostamente conferiam vida eterna aos que comessem deles. Os antigos egípcios, também possuíam lendas similares sendo que numa delas se apresentava a crença de que, depois do Faraó morrer, havia uma árvore da vida da qual teria de comer para se sustentar no domínio do seu pai, Rá. Na mitologia grega acreditava-se que nos Jardins das Hesperides, localizado numa ilha do oceano existiam as maçãs de ouro. Eram muito famosos na antiguidade, pois era lá que fluíam as fontes de néctar pelo divã de Zeus, ali a terra exibia as mais raras bênçãos dos deuses. Os persas possuíam uma tradição duma árvore da vida, a haoma, cuja resina conferia a imortalidade. A tradição chinesa menciona sete árvores maravilhosas. Uma delas, que é de jade, conferia a imortalidade pelo seu fruto. A mitologia escandinava fala de uma árvore sagrada chamada Yggdrasill, sob uma de suas raízes emanava uma fonte em que residia todo o conhecimento e toda a sabedoria. A mitologia nórdica fala de uma deusa chamada Iduna que guardava numa caixa as Maçãs da Imortalidade, que os deuses partilhavam a fim de renovar a juventude. Segundo a Bíblia, a árvore da vida era uma das duas árvores especiais que Deus colocou no centro do jardim chamado Éden. O primeiro casal humano foi impedido de alcançar esta árvore após terem desobedecido ao mandamento divino. Foram assim expulsos desse jardim ou paraíso original. Como forma de impedir que alguém voltasse a entrar no jardim e consequentemente comesse dos frutos da árvore da vida, Deus colocou criaturas sobre-humanas chamadas querubins, que possuíam uma espada de fogo que girava continuamente. (Count Eugene Goblet d'Alviella, Symbols: Their Migration and Universality. Dover Publications, 2000. ISBN 978-0486414379).
Estes exemplos nos mostram que o ser humano desde seus primórdios, busca desesperadamente achar um sentido para a vida, um objetivo para sua existência. De onde viemos? O que fazemos aqui? Para onde vamos? Porque a vida é tão atribulada? O que significa a morte? Esses e muitos outros questionamentos têm angustiado a humanidade. Quando a morte lhe parecia iminente o pintor francês Paul Gauguin pintou um quadro descrito como “derradeira expressão da força artística”. O livro “Paul Gauguin 1848-1903: O Sofisticado Primitivo” (em inglês) diz: “O espectro da atividade humana abrangido pelo quadro cobre todo o curso da vida, do nascimento à morte... Ele interpretava a vida como um grande mistério.” Gauguin chamou esse quadro de “De onde viemos? O que somos? Para onde vamos? (D’où venons-nous? Que sommes-nous? Où allons-nous?). O quadro de Gauguin levantou perguntas sobre o sentido da vida. Alguns preferem não pensar muito sobre tais assuntos, acham que devemos viver a vida da melhor maneira possível, sem muita preocupação com este tipo de questão, pois refletir sobre isso não levará a nada e acabaremos frustrados e se insistirmos neste tipo de questionamento ficaremos deprimidos.
Mas o intelecto humano não se contenta em apenas aceitar as coisas como são, afinal é isso que nos separa dos demais animais, que simplesmente vivem suas vidas sem questionar o sentido dela. Os animais irracionais não questionam sua origem, o objetivo de estarem aqui e para onde vão, suas preocupações se resumem em conseguir alimento, fugir dos predadores e perpetuar a espécie através do acasalamento, aliás, nem podemos dizer que essas coisas são uma preocupação, mas sim um instinto natural que comanda suas vidas. Já o ser humano é um animal racional, que acumula conhecimento através das eras, tem a capacidade de se auto avaliar e aprender de seus erros. Porém é imprevisível nos seus atos, pode num momento fazer coisas terríveis e em outro demonstrar o mais sublime amor.
Tanto é assim que não nos conformamos em ser um animal mais evoluído, não, precisamos ser algo mais, é necessário haver um propósito para nossa existência, temos de fazer parte de algo maior, afinal somos segundo a bíblia a imagem de Deus, criados a sua semelhança, filhos de um ser superior que se preocupa conosco, que está interessado em nossas decisões, que se importa com nossas ações. Desta forma nos sentimos importantes, queridos e amados, quem não gosta de si sentir assim? Esta crença num ser transcendental massageia nosso ego, eleva nossa auto-estima. “Se não existisse Deus, então seria necessário inventá-lo” já dizia Voltaire (Si Dieu n'existait pas il faudrait l'inventer. Collection complette des oeuvres de Voltaire. Volume 22, Página 406).

Diante de todo o exposto surge a questão. A crença religiosa surgiu da inconformidade do ser humano diante do fim inevitável da vida? Você tem medo da morte?
“Quando alguém replica a um assunto antes de ouvi-lo, é tolice da sua parte e uma humilhação”.
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d.paiva
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Parabens pelo excelente post "Apocalipse Adiado".

E sim, as crenças religiosas sempre foram algo criado pelos humanos diante do desconhecido. O desconhecido fogo, o desconhecido sol, o desconhecido eclipse, a desconhecida doença, a desconhecida fatalidades, e a tao desconhecida MORTE.

Tememos o desconhecido, todo animal se assusta diante de algo inesperado, diando de um ambiente descontrolado e diferente, só nos confortamos quando assim passamos a explorar, estudar, conhecer e dominar.

Porem, sabemos cientificamente diversas causas da morte, o acaso, a velhice... Porem, o que nao sabemos é como prolongar ou contorna-la, colocando nossos sonhos utopicos em pratica.

A religiao, a crença no sobrenatural, em deuses ou deus foi uma uma das criaçoes humanas para explicar ou confortar diante de algo desconhecido.

O que eu acredito particularmente é que a religiao como todo está com seu prazo de validade se esgotando, sua morte prevista e questao de tempo para sairmos da escuridao da ignorancia e a humanidade entrar na era do conhecimento.
Acredito que se ainda a terra existir daqui 1000 anos teremos um tipo de sociedade totalmente evoluido ao que é hoje, talvez um paraiso alcançado nao por milagres divinos e sim pela busca, trabalho e conhecimento humano. Mas é um pensamento meu.
"The lover of life's not a sinner..." Heaven and Hell.
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Lord Vader
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Seriam essas filosofias variadas sobre vida após a morte uma tentativa de defesa do nosso próprio psicológico às imensas dores provenientes da morte? É algo a se pensar. Imagine o que sente uma pessoa que perde um filho por exemplo? Dizem que não há algo pior para um pai do que viver mais do que seu filho. Não gosto nem de pensar. Essa crença de que a pessoa não viu seu filho ainda pela última vez lhe daria um pouco mais de paz.
Mas também pode haver um outro lado na questão. Será que uma crença assim tão universal (mesmo que demonstrada de diversos modos diferentes) não indicaria alguma coisa, um algo mais?
Bem, minha posição é que só esperando para ver. Não acredito nem desacredito.
Mas quanto a pergunta, sim, eu tenho medo da morte, infelizmente. Não da minha própria, mas daqueles próximos a mim. Inclusive acho que penso nisso demasiadamente. Eu queria poder viver como se a morte não existisse. Não dar a isso tanta importância assim, mas...
Alguns podem me considerar um fraco por não suportar essa sina, confesso, eu sou. Mas se caso tudo acabar aqui mesmo, pelo menos algo de mim continuará. A prole.
"Demore o tempo que for para decidir o que você quer da vida, e depois que decidir não recue ante nenhum pretexto, porque o mundo tentará te dissuadir" (Friedrich Nietzsche)
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Lord Vader
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Lord Vader escreveu: diversos modos diferentes
:shock: Malz aê rs.
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TJCalado
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Faço minhas as palavras de Jack Sparrow:
"Invejo a burrice, porque é eterna."
- Nelson Rodrigues
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APOCALIPSE ADIADO
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Acho muito interessante neste assunto as primeiras linhas do livro Desvendando o arco- íris:

"Nós vamos morrer, e isso nos torna afortunados. A maioria das pessoas nunca vai morrer, porque nunca vai nascer. As pessoas potenciais que poderiam estar no meu lugar, mas que jamais verão a luz do dia, são mais numerosas que os grãos de areia da Arábia. Certamente esses fantasmas não nascidos incluem poetas maiores que Keats, cientistas maiores que Newton. Sabemos disso porque o conjunto das pessoas possíveis permitidas pelo nosso DNA excede em muito o conjunto de pessoas reais. Apesar dessas probabilidades assombrosas, somos eu e você, com toda a nossa banalidade, que aqui estamos... Nós, uns poucos privilegiados que ganharam na loteria do nascimento, contrariando todas as probabilidades, como nos atrevemos a choramingar por causa do retorno inevitável àquele estado anterior, do qual a enorme maioria jamais nem saiu?".

Todos nós podemos nos considerar vencedores. Dentre mais de um milhão de espermatozoides, cada qual com uma carga cromossômica que combinada com o óvulo produz um código genético específico, foi o que produziu o nosso DNA que venceu esta disputa. Além disso, graças aos avanços da ciência (vacinas, exames pré-natal, incubadoras, ultrassons, cirurgias feitas ainda no ventre, etc, etc...) a maioria de nós conseguiu vencer os primeiros 5 anos de vida onde antigamente a mortalidade era de 400 mortes a cada 1000 crianças nascidas e hoje no Brasil não passa de 14 mortes para cada 1000. A maioria de nós teve a sorte de não nascermos com algum problema durante a gestação que poderia ter-nos causado uma Síndrome de Down, autismo, gêmeos siameses, etc, etc... Enfim, se chegarmos aos setenta anos de vida somos seres muito afortunados, privilegiados, diante de tudo que pode acontecer desde o começo de nossa concepção.
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Filosofo
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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O medo da morte certamente é uma das razões que fazem as pessoas inventarem/procurarem religiões.

Algumas outras razões:
Tribalismo: Nós contra eles. Nosso grupo de primatas quer sobreviver e fazer outros grupos não sobreviverem. Se nós desumanizarmos as crenças deles será fácil de matá-los. Eles podem ser parecidos com nós, mas não é assassinato se eles estão do lado inimigo servindo a outros deuses.

Regras mentirosas: Regras sobre comida, sexo, cabelo, roupas, cerimônias, etc. Os humanos não conseguem lidar com o conflito entre seus instintos e sua racionalidade e inventam meios religiosos de controlar isso.

Desejo de controlar o ambiente: Oração, magia, encantamentos. São algumas das fantasias da mente humana para fingirem ter algum controle sobre o meio e assim trazer conforto emocional. É díficil aceitar que as coisas podem fugir do controle e nos matar a qualquer momento.

Medo do desconhecido: As pessoas gostam do que é familiar. O desconhecido causa medo e pavor. Por isso criam tradições e têm medo de coisas como casamento homossexual. O que é diferente causa desconforto. Duvida disso? Tente sair no meio da mata, sem nenhum preparo ou comida, simplesmente entre na aventura de vez e sinta o frio na barriga que isso trás.

Isso tudo vem dos instintos básicos: sobreviver e procriar.
"Seria Deus desejoso de prevenir o mal mas incapaz? Portanto não é omnipotente. Seria ele capaz, mas sem desejo? Então é malévolo. Seria ele tanto capaz quanto desejoso? Então por que há o mal?"
- Epicuro
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kooboo
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Medo da morte, medo do inexplicado, uma visão reconfortante para quem encara desafios e morte... mas a verdade é que "uma mentira, por mais consoladora que seja, não se torna uma verdade".
[]'s
kooboo

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APOCALIPSE ADIADO
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Pesquisas indicam que aproximadamente 95% da população dos Estados Unidos acredita que vá sobreviver à própria morte. À parte a aspiração dos mártires, não consigo deixar de me perguntar quantas pessoas moderadamente religiosas que alegam acreditar nisso realmente acreditam, do fundo do coração. Se elas estivessem mesmo sendo sinceras, não deveriam todas comportar-se como o abade de Ampleforth? Quando o cardeal Basil Hume disse a ele que estava morrendo, o abade ficou encantado: "Parabéns! Que ótima notícia. Queria estar indo com o senhor". O abade, ao que parece, era mesmo um crente sincero. Mas é exatamente por ser tão rara e inesperada que a história chama a nossa atenção, quase nos diverte de um jeito que faz lembrar a charge que mostra uma jovem carregando um cartaz de "Faça amor, não faça guerra", nua em pêlo, e um observador exclamando: "Isso é o que eu chamo de sinceridade!". Por que todos os cristãos e muçulmanos não dizem coisas parecidas com o que o abade disse quando ficam sabendo que um amigo está morrendo? Quando uma mulher devota ouve de um médico que só tem alguns meses de vida, por que não sorri de entusiasmo, como se tivesse acabado de ganhar uma viagem para as ilhas gregas? "Não vejo a hora!" Por que os fiéis que vão visitá-la em seu leito não a enchem de recados para os que já partiram antes? "Por favor mande minhas lembranças para o tio Robert quando o vir..." Por que as pessoas religiosas não falam desse jeito quando estão na presença dos moribundos? Não pode ser porque na verdade elas não acreditam em tudo aquilo em que fingem acreditar? Ou talvez acreditem, mas temam o processo de morrer. Com bons motivos, já que nossa espécie é a única que não pode ir ao veterinário para acabar sem dor com o sofrimento. Mas, nesse caso, por que a oposição mais eloquente à eutanásia e ao suicídio assistido vem das religiões? No modelo "Abade de Ampleforth" ou "Férias nas ilhas gregas" de morte, não seria de esperar que as pessoas religiosas fossem as últimas a se agarrar, desesperançosamente, à vida terrena? E no entanto é impressionante como, quando se encontra alguém que é ardentemente contra a eutanásia ou contra o suicídio assistido, dá para apostar um bom dinheiro que essa pessoa seja religiosa. A razão oficial pode ser que matar é sempre pecado. Mas por que considerar isso pecado se você acreditar sinceramente que está acelerando sua viagem para o céu? O processo de morrer pode muito bem ser, dependendo de nossa sorte, doloroso e desagradável — o tipo de experiência da qual nos acostumamos a ser protegidos pela anestesia geral, como na remoção do apêndice. Se seu animal de estimação estiver morrendo, cheio de dor, você será chamado de cruel se não o levar ao veterinário para que ele dê ao bicho uma anestesia geral da qual ele não acordará. Mas, se seu médico realizar exatamente o mesmo serviço misericordioso com você, se você estiver morrendo cheio de dor, corre o risco de ser indiciado por assassinato. Quando eu estiver morrendo, gostaria que minha vida fosse tirada sob anestesia geral, exatamente como no caso de um apêndice doente. Mas esse privilégio não me será permitido, porque tenho o azar de ter nascido membro da espécie Homo sapiens, em vez, por exemplo, da Canis familiaris ou da Felis catus. Pelo menos é o que acontecerá se eu não me mudar para um lugar mais esclarecido, como a Suíça, a Holanda ou o Oregon. Por que lugares esclarecidos assim são tão raros? Principalmente por causa da influência da religião. Mas, podem dizer, não há uma diferença importante entre ter o apêndice removido e ter a vida removida? Não, na verdade; não se você estiver prestes a morrer de qualquer jeito. E não se você tiver uma crença religiosa sincera na vida após a morte. Se se tem tal crença, morrer é só uma transição de uma vida para outra. Se a transição é dolorosa, não há motivo para querer que ela aconteça sem anestesia, assim como não se desejaria retirar o apêndice sem anestesia. Quem, como nós, vê a morte como uma coisa terminal, em vez de uma transição, é que deveria resistir ingenuamente à eutanásia ou ao suicídio assistido. Só que somos nós que os defendemos. Na mesma linha, o que devemos pensar da observação de uma enfermeira que conheço, que tem uma experiência de vida inteira administrando um asilo, onde a morte é uma ocorrência regular? Ela percebeu, ao longo dos anos, que os que mais têm medo da morte são os religiosos. A observação precisaria de sustentação estatística, mas, pressupondo que ela esteja certa, o que é isso? O que quer que seja, não é um depoimento muito bom do poder da religião para reconfortar os moribundos.
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Lord Vader
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Re: Você tem medo da morte? A crença religiosa surgiu por isso?

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Hoje assisti a um vídeo que me fez lembrar deste tópico. Uma senhora fica frente a frente com o assassino do seu filho. Pelas expressões utilizadas dá para notar que é uma pessoa religiosa. É claro que ela deve estar arrasada mas é impressionante a serenidade que a fé proporciona a ela diante da sua grande perda.

phpBB [video]


Esse vídeo me fez lembrar também a ocasião onde um ex-estudante meu faleceu de parada cardíaca. No enterro a mãe dele, uma TJ, chorou muito, mas poucos dias depois veio falar comigo com um sorriso estampado no rosto pedindo para que eu continuasse o estudo dele quando este fosse ressuscitado.
Esse poder reconfortante da religião é notável.
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