Olha Lipe, eu não poderia deixar de comentar o seu desabafo. Pra mim já foi mais difícil, mas ainda não está sendo fácil. É como se estivéssemos seguros em cima de uma estrutura de concreto, que de repente se transforma em areia movediça. Outra sensação que me lembro de ter tido, é como se um enorme caminhão tivesse passado por cima da gente, e agora ficamos caídos no asfalto, nos perguntando o que aconteceu, porque nem vimos o que nos atingiu. Os comentários da Erminoni sobre não desejar um Paraíso tão padronizado assim, me fez lembrar que no começo desse meu processo, enviei uma correspondência para o Mentes Bereanas, cujo parte do teor segue abaixo:
EQUILIBRIUM
Há algum tempo atrás, antes de tudo isso ocorrer, eu estava assistindo o filme Equilibrium, com Christian Bale, que conta uma ficção futurista, onde ninguém podia expressar emoções,
nem falar o que estava sentindo, pois um regime totalitário alegava que assim seria melhor para a paz mundial, e dessa forma manipulava a todos.
Senti um frio na espinha ao assistir o filme e não pude deixar de perceber os paralelos entre o regime do Tetragramatom (apenas coincidência esse nome?) e a imposição da maneira de pensar e de agir da Sociedade da Torre de Vigia a nós membros.
Eu já tinha percebido esse paralelo entre o filme e a organização já faz algum tempo, antes de eu ler esses livros "apóstatas", mas depois que eu os li, esse paralelo se tornou mais evidente, pois as poucas pessoas de minha família com quem me abri, me alertaram, que eu não deveria comentar essas coisas com ninguém, e o mesmo fizeram os anciãos na comissão judicativa que me tirou o cargo.
Eu me vi na situação do filme e pensei: "Caramba, que comunidade é essa em que eu vivo, onde você não pode expressar o que pensa, e nem o que sente?".
E uma das coisas em que eu mais me orgulhava das Testemunhas de Jeová, que é a união na maneira de pensar, um só ensino em todo mundo, hoje se tornou para mim causa de tropeço. Às vezes tem se tornado insuportável assistir às reuniões e ficar constantemente ouvindo "mesa de Jeová", "alimento no tempo apropriado", "organização", etc...
À que custo essa união? Essa uniformidade? Essa padronização da maneira de pensar? No referido filme, todas as pessoas usam roupa social preto e branca, uniformizadas, padronizadas, parecendo robôs. Às vezes eu sinto que mesmo sem ter essa intenção a Organização tem feito a mesma coisa. Não é à tôa que num dos melhores videos produzidos pela Torre de Vigia, "A Criação declara a Glória de Deus" onde um pai ensina seu filho sobre as criações de Jeová, a postura e a artificialidade do pai e do filho tornam o vídeo menos atraente, menos emotivo, porque eles acabam sendo típicos irmãos "teocráticos" padronizados. Na verdade, hoje eu percebo que mesmo a vida no paraíso terrestre se tornava menos atraente pra mim, porque parecia que teria que seguir um esquema rígido de pessoas se comportando e pensando de maneira uniforme, como ilustrado nas pinturas das publicações sobre o novo mundo.
Penso que Jeová se agrada na diversidade, como exemplificado pela abundante diversidade que ele deixou na natureza (Prov. 8:31). Nenhuma planta tem 2 folhas exatamente iguais, nenhuma flor tem 2 pétalas exatamente iguais, até mesmo as impressões digitais e todo o resto físico é diferente de ser humano para ser humano. Porque devemos pensar então que a riqueza que Deus criou dentro da gente, "o homem que somos no íntimo" deveria de alguma forma ser uniformizada e encaixada em moldes?
E isso não é uma prerrogativa exclusiva da Torre de Vigia. Penso que esse é um problema grave da maioria das denominações, que impõem sua cultura sobre o adepto, destruindo as raízes que fez parte da criação dele.
Como exemplo: determinado jovem sempre gostou de música sertaneja, porque ele cresceu ouvindo isso na sua família e essas músicas lhe fazem lembrar de seu falecido pai que ouvia essas músicas desde que ele era criança. Mas quando ele passa a ser membro de uma denominação pentecostal, ele é persuadido a jogar todos os discos com "música do mundo" fora e ouvir apenas música gospel, acreditando que Deus espera isso dele. Com isso, a perda cultural, de diversidade e de lembranças é maior do que esse jovem possa imaginar .
A mesma perda significativa ocorre quando a Torre de Vigia insiste em fazer com que as pessoas parem de comemorar aniversários natalícios, feriados ou festividades para ficar "espiritualmente pura".
Quando escrevi essas palavras acima, há uns 2 anos atrás, morria de medo de perder a fé. Hoje perdi o medo e boa parte da fé. Sou um Agnóstico Reverente que fecha os ouvidos quando assiste às reuniões, mas não hesita em se curvar diante do Deus da Natureza, o Deus de Baruch Spinoza. Quanto a ter certeza, cada vez mais desaparece minha necessidade de ter certeza de alguma coisa. Eu não sei se você já estava no fórum quando postaram esse link esplendido abaixo do filósofo de rua Eduardo Marinho, falando sobre a tolice de ter certezas no campo Metafísico:
Sobre o Deus de Spinoza, que Albert Instein disse realmente acreditar, mas cujo texto pode ser apócrifo (não produzido por Spinoza) segue abaixo:
Einstein quando perguntado se acreditava em Deus, respondeu: “Acredito no Deus de Spinoza, que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe, e não no Deus que se interessa pela sorte e pelas ações dos homens”.
DEUS SEGUNDO SPINOZA
“Pára de ficar rezando e batendo o peito! O que eu quero que faças é que saias pelo mundo e desfrutes de tua vida.
Eu quero que gozes, cantes, te divirtas e que desfrutes de tudo o que Eu fiz para ti.
Pára de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa.
Minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias. Aí é onde Eu vivo e aí expresso meu amor por ti.
Pára de me culpar da tua vida miserável: Eu nunca te disse que há algo mau em ti ou que eras um pecador, ou que tua sexualidade fosse algo mau. O sexo é um presente que Eu te dei e com o qual podes expressar teu amor, teu êxtase, tua alegria.
Assim, não me culpes por tudo o que te fizeram crer.
Pára de ficar lendo supostas escrituras sagradas que nada têm a ver comigo. Se não podes me ler num amanhecer, numa paisagem, no olhar de teus amigos, nos olhos de teu filhinho… Não me encontrarás em nenhum livro! Confia em mim e deixa de me pedir. Tu vais me dizer como fazer meu trabalho?
Pára de ter tanto medo de mim. Eu não te julgo, nem te critico, nem me irrito, nem te incomodo, nem te castigo. Eu sou puro amor.
Pára de me pedir perdão. Não há nada a perdoar. Se Eu te fiz… Eu te enchi de paixões, de limitações, de prazeres, de sentimentos, de necessidades, de incoerências, de livre-arbítrio.
Como posso te culpar se respondes a algo que eu pus em ti?
Como posso te castigar por seres como és, se Eu sou quem te fez?
Crês que eu poderia criar um lugar para queimar a todos meus filhos que não se comportem bem, pelo resto da eternidade?
Que tipo de Deus pode fazer isso?
Esquece qualquer tipo de mandamento, qualquer tipo de lei; essas são artimanhas para te manipular, para te controlar, que só geram culpa em ti.
Respeita teu próximo e não faças o que não queiras para ti.
A única coisa que te peço é que prestes atenção a tua vida, que teu estado de alerta seja teu guia.
Esta vida não é uma prova, nem um degrau, nem um passo no caminho, nem um ensaio, nem um prelúdio para o paraíso.
Esta vida é o único que há aqui e agora, e o único que precisas.
Eu te fiz absolutamente livre.
Não há prêmios nem castigos. Não há pecados nem virtudes. Ninguém leva um placar. Ninguém leva um registro. Tu és absolutamente livre para fazer da tua vida um céu ou um inferno.
Não te poderia dizer se há algo depois desta vida, mas posso te dar um conselho.
Vive como se não o houvesse.
Como se esta fosse tua única oportunidade de aproveitar, de amar, de existir.
Assim, se não há nada, terás aproveitado da oportunidade que te dei. E se houver, tem certeza que Eu não vou te perguntar se foste comportado ou não.
Eu vou te perguntar se tu gostaste, se te divertiste… Do que mais gostaste? O que aprendeste?
Pára de crer em mim – crer é supor, adivinhar, imaginar.
Eu não quero que acredites em mim. Quero que me sintas em ti.
Quero que me sintas em ti quando beijas tua amada, quando agasalhas tua filhinha, quando acaricias teu cachorro, quando tomas banho no mar.
Pára de louvar-me!
Que tipo de Deus ególatra tu acreditas que Eu seja? Me aborrece que me louvem. Me cansa que agradeçam.
Tu te sentes grato? Demonstra-o cuidando de ti, de tua saúde, de tuas relações, do mundo.
Te sentes olhado, surpreendido?… Expressa tua alegria! Esse é o jeito de me louvar.
Pára de complicar as coisas e de repetir como papagaio o que te ensinaram sobre mim.
A única certeza é que tu estás aqui, que estás vivo, e que este mundo está cheio de maravilhas.
Para que precisas de mais milagres?
Para que tantas explicações?
Não me procures fora!
Não me acharás.
Procura-me dentro… aí é que estou, batendo em ti.
Baruch Spinoza.