O livro é muito forte, mexe com os nossos paradigmas.
Vou destacar um ponto do livro que me chamou a atenção.
O autor fala que grupos de no máximo 150 indivíduos formam laços de convívio suficientemente fortes.
Na página 30, lemos uma introdução a esse assunto:
O autor descreve um grupo de chimpanzés e como eles estruturam um convívio hierarquizado pautado em alianças.O macho alfa normalmente conquista
essa posição não porque seja fisicamente mais forte, mas porque lidera uma
coalizão grande e estável. Essas coalizões exercem um papel central não só
durante as lutas pela posição de alfa como também em quase todas as atividades
cotidianas. Membros de uma mesma coalizão passam mais tempo juntos,
partilham alimentos e ajudam uns aos outros em momentos de dificuldade.
Há limites claros ao tamanho dos grupos que podem ser formados e
mantidos de tal forma. Para funcionar, todos os membros de um grupo devem
conhecer uns aos outros intimamente. Dois chimpanzés que nunca se
encontraram, nunca lutaram e nunca se alisaram mutuamente não saberão se
podem confiar um no outro, se valerá a pena ajudar um ao outro nem qual deles
é superior na hierarquia. Em condições normais, um típico bando de chimpanzés
consiste de 20 a 50 indivíduos. À medida que o número em um bando de
chimpanzés aumenta, a ordem social se desestabiliza, levando enfim à ruptura e
à formação de um novo bando por alguns dos animais. Apenas em alguns casos
os zoólogos observaram grupos maiores que cem. Grupos separados raramente
cooperam e tendem a competir por território e por alimentos. Os pesquisadores
documentaram guerras prolongadas entre grupos, e até mesmo um caso de
atividade “genocida” em que um bando assassinou sistematicamente a maioria
dos membros de um bando vizinho.
Na página 31 segue mais um trecho esclarecedor:
Fofoca aqui não é uma bobagem.Mas até mesmo a fofoca tem seus limites.
Pesquisas sociológicas demonstraram que o tamanho máximo “natural” de um
grupo unido por fofoca é de cerca de 150 indivíduos. A maioria das pessoas não
consegue nem conhecer intimamente, nem fofocar efetivamente sobre mais de
150 seres humanos.
O autor fala da fofoca enquanto um importante meio de se comunicar e de estabelecer união e relacionamentos dentro de um grupo não muito grande. Aqui ele fala de grupos presenciais, que convivem, que experienciam coisas juntos, que trocam favores, informações úteis e fofocas sobre os eventos dentro do grupo, tipo quem está namorando quem, quem está fazendo o quê, que incidente ocorreu com fulano, etc.
A fofoca é fator imprescindível no estabelecimento de um grupo que se conhece. Portanto, um grupo sem fofoca seria um grupo de estranhos, de pessoas que não se interessam umas pelas outras, de um grupo indiferente uns pelos outros.
O autor NÃO separa a fofoca nociva, que seria maldosa, mentirosa ou de má-fé e a fofoca sem maldade. Simplesmente o autor fala da fofoca dentro de um grupo como uma forma de comunicação que faz o grupo ser um grupo íntimo, de pessoas que se conhecem. Ponto.
Só que, a seguir o autor fala do colapso do grupo pequeno quando ele ultrapassa os 150 integrantes. Esse grupo maior - que deixou de se pequeno - não consegue mais ser um grupo íntimo, porque, em tese, um ser humano não consegue ser íntimo de mais do que 150 pessoas.
Daí vem o pulo do gato:
Como um grupo tão grande quanto o de uma nação, com quase 200 milhões de habitantes, consegue conviver em relativa harmonia? Sim, porque são 200 milhões de ESTRANHOS, pessoas que não se conhecem, como tudo não vira um grande caos?
A questão é que essa:
O autor não está dizendo que DEUS não existe, mas está dizendo que as concepções de Deus, de como ele é e o que ele quer, são humanas. Mesmo que a pessoa acredite que a Bíblia é perfeita, ainda cabem muitas interpretações da Bíblia que são muito humanas. Como sabemos o Corpo Governante já mudou de ideia tantas vezes sobre o que Jeová disse ou quer que só prova que as coisas são exatamente assim.Toda cooperação humana em grande escala – seja um Estado moderno,
uma igreja medieval, uma cidade antiga ou uma tribo arcaica – se baseia em
mitos partilhados que só existem na imaginação coletiva das pessoas. As igrejas
se baseiam em mitos religiosos partilhados. Dois católicos que nunca se
conheceram podem, no entanto, lutar juntos em uma cruzada ou levantar fundos
para construir um hospital porque ambos acreditam que Deus encarnou em um
corpo humano e foi crucificado para redimir nossos pecados. Os Estados se
baseiam em mitos nacionais partilhados. Dois sérvios que nunca se conheceram
podem arriscar a vida para salvar um ao outro porque ambos acreditam na
existência da nação sérvia, da terra natal sérvia e da bandeira sérvia. Sistemas
judiciais se baseiam em mitos jurídicos partilhados. Dois advogados que nunca se
conheceram podem unir esforços para defender um completo estranho porque
acreditam na existência de leis, justiça e direitos humanos – e no dinheiro dos
honorários.
Mas nenhuma dessas coisas existe fora das histórias que as pessoas
inventam e contam umas às outras. Não há deuses no universo, nem nações, nem
dinheiro, nem direitos humanos, nem leis, nem justiça fora da imaginação
coletiva dos seres humanos.
(trecho da página 32)
Mas o ponto que questão aqui, é a chave da civilização: a capacidade comunicar sobre coisas que não existem e que unem e organizam grandes multidões de seres humanos. As nossas crenças civilizatórias, podemos dizer assim. Sem elas seríamos um bando de estranhos desagregados. Com elas somos cidadãos de um país.
Voltando às Testemunhas de Jeová.
As congregações são relativamente pequenas, mas muitas delas tem mais de 150 membros. Só que o que realmente une a multidão de Testemunhas de Jeová, aparentemente tão obedientes e pacíficas, certamente é a ficção de que são um povo apartado e especial para Deus, de que são regidas pelos representantes de Deus na Terra, o Corpo Governante, etc.
Então podemos ver que o grupo pequeno das congregações das TJs é tanto unido pela fofoca enquanto comunicação que une um grupo íntimo como o alça ao grupo grande, a grande multidão de Testemunhas de Jeová, através nas narrativas daquilo que não existe, mas dá sentido, dá propósito e também une, produz cooperação e hierarquia.
— Interessante, né?
Eu achei. Espero que este tópico tenha ficado compreensível. O assunto é pouco complexo.
Recomendo a leitura do livro!